quarta-feira, 30 de setembro de 2015

PEC da vergonha

Se realmente fôssemos um país que aprendeu que a primeira lição na vida de um político é não roubar, o primeiro ato após a descoberta de todo o lodaçal da Operação Lava Jato seria inibir doações privadas para campanhas eleitorais.  

Mas não, mesmo depois de o Supremo Tribunal Federal declarar, na última semana, a inconstitucionalidade das doações, comandados por Cunha, Renan e Temer, o Congresso articula, no apagar das luzes, a aprovação relâmpago de uma PEC que, segundo interpretações duvidosas, deverá forçar o STF a julgar a matéria novamente.    É a lei valendo apenas quando o resultado interessa a quem as faz.

Feito isso, basta um simples ministro de nome Gilmar Mendes pedir vistas do processo.  E tudo volta a ser como dantes no quartel da corrupção.  E olha que estamos falando do Supremo Tribunal Federal, instância maior do judiciário brasileiro.
 
Será que o termo “INCONSTITUCIONAL”, doravante, terá outro significado nos dicionários tupiniquins?  Alô, alô, OAB e políticos do bem, não vejo no horizonte ninguém entrar com um mandado segurança preventivo, nenhuma ADIN.
 
Pobre Brasil.  Um escárnio, uma vergonha.

Abraços Sustentáveis


Odilon de Barros

Quinze anos e para sempre


José Graziano da Silva. Foto: Cortesia do autor
José Graziano da Silva. Foto: Cortesia do autor

Os próximos 15 anos serão decisivos para o futuro de nosso planeta. Durante esse período, enfrentaremos alguns dos maiores desafios do século 21, em meio a uma transição contínua e profunda na economia global.
A superação da fome e da pobreza extrema são os desafios mais importantes. Hoje em dia, quase 800 milhões de pessoas não têm alimento suficiente para comer, apesar de se produzir comida suficiente no mundo para alimentar a todos. É evidente que precisamos de soluções urgentes para superar os gargalos estruturais que impedem que os que sofrem fome tenham acesso aos alimentos.
Em outras palavras, a inclusão social deve se converter na coluna vertebral do desenvolvimento. Entretanto, não conseguiremos nem a inclusão social e nem o desenvolvimento, a menos que nossas decisões estejam guiadas pela sustentabilidade.
Somos a primeira geração que pode acabar com a fome e fazer com que a segurança alimentar e nutricional seja verdadeiramente universal. E talvez também sejamos a última geração em condições de evitar danos irreversíveis provocados pela mudança climática.
O contexto político necessário para avançar na direção correta requer um grau sem precedentes de compromisso político.
Este mês foi dado um importante passo nesse sentido, quando a comunidade internacional apoiou os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), com uma agenda ambiciosa para mudar o mundo para melhor nos próximos 15 anos.
Esse novo pacto global para o futuro inclui crucialmente acabar com a pobreza e a fome até 2030, a mitigação e adaptação à mudança climática e a busca de formas mais sustentáveis de fazer com que a oferta atenda a demanda.
As decisões que tomamos como consumidores se tornaram tão importantes para o futuro quanto as que tomamos como produtores.
Além dos cerca de 800 milhões de pessoas que sofrem desnutrição crônica, a má nutrição também é um problema importante com aproximadamente dois bilhões de pessoas sofrendo deficiências de micronutrientes e outros 500 milhões que sofrem obesidade, esta última uma doença que está aumentando em muitos países de renda média e alta.
O mundo que se prevê por meio da consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável não é uma quimera inalcançável. Não é uma utopia e podemos torná-lo realidade.
A solução está no problema. Na medida em que a riqueza continuar ganhando distância da justiça, a sobrevivência dependerá mais e mais do imperativo da cooperação.
Ou construímos um futuro para todos, ou não haverá futuro aceitável para ninguém. Qualquer dúvida a respeito empalidece diante do êxodo que presenciamos, com refugiados arriscando suas vidas em uma tentativa desesperada de encontrar uma vida melhor em outro lugar.
Mais de 70% da insegurança alimentar no mundo se concentra nas zonas rurais dos países pobres e em desenvolvimento.
Uma das soluções é reconhecer e apoiar o papel que a agricultura familiar de pequena escala pode desempenhar para conseguir fome zero de uma maneira sustentável.
Para conseguir isso. precisamos de políticas públicas que desenvolvam as capacidades das pessoas, apoiar a produção, facilitar o acesso ao crédito financeiro, à tecnologia e a outros serviços, e promover a cooperação internacional.
Para erradicar a fome e a pobreza, devemos começar fazendo mais do que enfrentar situações de emergência quando ocorrem e em seu lugar dirigir nossos esforços para fazer frente às condições que as causam.
O custo do fracasso está claro. Se prevalecer o enfoque de negócio, como tem sido até agora, em 2030 ainda teremos 650 milhões de pessoas sofrendo fome.
Estimamos que para acabar com a fome até 2030 é necessária uma combinação de investimentos em proteção social e agricultura e desenvolvimento rural de aproximadamente US$ 267 bilhões. Isto significa cerca de US$ 160 ao ano para cada pessoa que sofre fome.
Isto é mais ou menos o preço de um telefone celular. Trata-se de uma quantidade relativamente pequena a pagar com a finalidade de liberar o mundo do flagelo da fome e de fazê-lo durante nossas vidas. Envolverde/IPS/Utopia Sustentável
José Graziano da Silva é diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Resolver problemas ligados à água é ‘tarefa urgente’ para implementar novos objetivos da ONU


Moradores da vila Woukpokpoe, no Benin, buscam água potável. Foto: Banco Mundial/Arne Hoel
Moradores da vila Woukpokpoe, no Benin, buscam água potável. Foto: Banco Mundial/Arne Hoel
“Em todo o mundo, a demanda por água deve crescer mais de 40% até 2050”, disse o vice-secretário-geral da ONU, Jan Eliasson, neste domingo (27), durante o encontro do Comitê Diretivo dos Amigos da Água, que aconteceu durante a Cúpula do Desenvolvimento Sustentável, na sede das Nações Unidas, em Nova York. “Pressões de população, das mudanças climáticas e de energia, além de crescentes necessidades agrícolas fazem da tarefa de encontrar soluções sustentáveis para os desafios relacionados com a água uma tarefa urgente e crucial para cada vez mais regiões do mundo.”
“A água nunca deve ser uma razão para rivalidade ou competição “, disse Eliasson. “A água deve ser uma fonte de cooperação e de segurança e prosperidade partilhada. Lembremo-nos de que a água é nossa principal fonte de vida. Portanto, este é também, fundamentalmente, um desafio existencial e uma obrigação moral. ”
Ao falar sobre os desafios relacionados à nova Agenda para o Desenvolvimento Sustentável, Eliasson afirmou que o “teste decisivo para esta nova agenda será sua implementação, como traduzir essa visão em realidade no terreno. Substancialmente transformar sociedades e economias exige vontade política, esforços vigorosos, bem como de criatividade e inovação”. (ONU Brasil/ #Envolverde/Utopia Sustentável)

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

As promessas ambientais do Brasil para o mundo


Área recém desmatada em Roraima. Foto: © Greenpeace/Marizilda Cruppe
Área recém desmatada em Roraima. Foto: © Greenpeace/Marizilda Cruppe
Cumprir a lei florestal só em 2030, alcançar metas para energias renováveis menores que as já praticadas e efetuar grandes investimentos em fontes fósseis são algumas das contradições
Neste domingo, 27 de outubro, a Presidente Dilma anunciou, em assembléia da ONU, os planos que o Brasil deve submeter oficialmente como sua contribuição no combate às mudanças do clima – e as metas apresentam pontos de incoerência preocupantes.
Para o governo, chegaremos em 2030 emitindo 1,33 bilhões de toneladas de carbono, número 33% maior do que as projeções do que seria possível fazer segundo proposta de organizações da sociedade civil. Apesar de ficarem aquém do desejável, o formato de metas absolutas e o fato de apresentar números de redução para os anos de 2025 e 2030 são bons indicadores. Porém, na área de florestas, setor do país que mais emite gases que aquecem o planeta, o governo derrapa e a conta não fecha, o que coloca boa parte do plano em suspensão.
“O discurso do governo impressiona a plateia, principalmente quando comparado com o deserto de promessas de muitos outros países. Mas quando olhamos com o cuidado necessário, a parte de florestas é baseada em premissas falhas e continua permitindo o desmatamento, além de perder oportunidades no setor de energia”, diz Marcio Astrini, do Greenpeace.
Florestas
Na parte de florestas, o plano se baseia em implementar a lei (código florestal), mas só daqui 15 anos, deixando claro que até lá permitirá novos desmatamentos compensados com replantio. Para o governo, isso seria suficiente para reduzir drasticamente as emissões do setor. Mas a conta não fecha.
Segundo estudo publicado na revista Science, os professores da Universidade Federal de Minas Gerais, Britaldo Soares e Raoni Rajao afirmam que a simples implementação da lei de florestas não será capaz de deter a perda de cobertura florestal, podendo, inclusive, permitir que mais de 88 milhões de hectares sejam liberados para o desmatamento, aumentando nossa conta de emissões.
Compensar áreas legalmente autorizadas indica que o desmatamento continuará, e a taxas não determinadas. Além disso, o replantio de novas áreas desmatadas não compensam economicamente, visto que é muito mais custoso do que preservá-las. A proposta de novos desmatamento perde ainda mais sentido devido ao fato de que o Brasil já detém áreas abertas em quantidade suficiente para assegurar o aumento da produção de alimentos sem a necessidade de novas derrubadas de vegetação.
Soma-se a isso o problema de que o caminho escolhido pelo governo para resolver a situação das florestas simplesmente ignora instrumentos como a criação de unidades de conservação e terras indígenas, que são seguramente a maneira mais eficiente de frear o desmatamento.
“Além da conta do plano para florestas não fechar, o anunciado traz um problema ainda mais grave, que é moral, ao ter como meta cumprir a legislação daqui a 15 anos (em 2030). Na prática, isso significa que, em sua gestão, o crime florestal vingará e ainda sentencia que os outros próximos três mandatos presidenciais seguirão o mesmo caminho. Tudo isso em um momento do país no qual as pessoas não aguentam mais ouvir falar em crime e má gestão. O exemplo é negativo e vem da Presidente. Lamentável”, completa Astrini.
Energia
Para energia, a meta de alcançar 23% das fontes eólica, solar e biomassa na matriz elétrica de 2030 é positiva, mas fica abaixo do ritmo atual de contratação dessas fontes em leilões. Para chegar nesse patamar, a contratação média anual necessária seria de 3,1 GW, mas, só em 2015, já contratamos 3,7 GW. A intenção de reduzir o consumo de eletricidade de 2030 em 10% por conta de medidas de eficiência energética não representa novidade, pois já vinha do Plano Nacional de Eficiência Energética.
O que fica mal explicado é a partir de quando e como o governo pretende mudar os rumos que vem adotando no setor até o momento.
Até agora, as medidas efetivas para o setor se concentraram em carbonizá-lo com políticas como o subsidio da gasolina, que levou ao declínio acentuado da indústria da cana, nos descontos no IPI para incentivar o uso de carros em detrimento de investimentos em transporte público, na negação de linhas de crédito para a energia solar distribuída e tecnologias de smartgrids. O plano decenal de energia, que é a expressão mais clara da visão do governo para a área, prevê que 70% de investimentos do setor para a próxima década ocorrerão em fontes fósseis.
“Poderia ser mais ousado. Mas o problema maior é que, no discurso, o plano apresenta um rumo, e na prática, os investimentos do governo ocorrem em outro”, afirma Astrini.
Agricultura
Não ficou claro quais serão os resultados em termos de redução para o setor. Iniciativas como a recuperação de áreas de pastagens e a promoção de modelos que combinem florestas e agricultura, com baixo carbono, já existem e são bem-vindas, mas, até o momento, não saíram do papel. Dos bilhões destinados anualmente para o setor, apenas uma ínfima parcela tem como objetivo promover a diminuição das emissões.
Este é um setor dos mais importantes. Na pecuária, por exemplo, poderemos ter uma solução matricial, que é resolver o problema de emissões entéricas, além de liberar áreas para o desenvolvimento da agricultura e diminuir a pressão sobre a floresta.
Eliminar o desmatamento, investir em renováveis e na melhoria de nossa agricultura não é um favor que fazemos ao mundo. É um investimento na garantia do nosso desenvolvimento e um benefício econômico ao país. Devemos perseguir estas metas independente do que os outros países farão e de toda essa discussão em torno da crise climática, pois é vantajoso do ponto de vista social, econômico e para nosso desenvolvimento.
Caso não cheguemos à um acordo, seremos um dos países mais impactados pelas alterações climáticas, o que trará consequências desastrosas para a economia, visto que boa parte dela é baseada na produção de alimentos, vulnerável ao clima, assim como nossa energia, que depende de estabilidade hídrica. Nesse contexto, as mudanças climáticas cobrararão uma conta que irá recair sobre os mais pobres. Acima de tudo, a questão climática é um problema social, ainda mais para o Brasil, e devemos liderar essa agenda. Qualquer falta de ambição em clima prejudicará diretamente as populações mais vulneráveis. (Greenpeace Brasil/ #Envolverde/Utopia Sustentável)

Uma nova chance para o planeta


Agenda de Desenvolvimento Sustentável global foi adotada por unanimidade pelos 193 Estados-membros da ONU
2030

Uma nova agenda global para acabar com a pobreza até 2030 e buscar um futuro sustentável para todos no planeta foi adotada, na última sexta-feira (25), por unanimidade, pelos 193 Estados-membros das Nações Unidas, no início da Cúpula da ONU sobre o Desenvolvimento Sustentável 2015. A histórica adoção da nova Agenda de Desenvolvimento Sustentável, com 17 Objetivos Globais, foi recebida com uma ovação pelas delegações que incluíam muitos dos líderes de mais de 150 países do mundo que estão participando da abertura da Cúpula na sede da ONU, em Nova York.
Inaugurando uma nova era de ação nacional e da cooperação internacional, a nova agenda compromete todos os países a tomar uma série de ações que não somente enfrentarão as causas profundas da pobreza, mas também aumentarão o crescimento econômico e a prosperidade, além de atender os problemas ligados à saúde, educação e necessidades sociais das pessoas e, ao mesmo tempo, proteger o meio ambiente.
Durante a cerimônia de abertura da Cúpula, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, disse que “A nova agenda é uma promessa dos líderes para todas as pessoas em todos os lugares. É uma visão universal, integrada e de transformação para um mundo melhor”.
“É uma agenda para as pessoas, para acabar com a pobreza em todas suas formas. É uma agenda de prosperidade partilhada, paz e parceria (que) transmite a urgência da ação do clima (e) está enraizada na igualdade de gênero e no respeito aos direitos de todos. Acima de tudo, promete não deixar ninguém para trás.”
“O verdadeiro teste do compromisso com a Agenda 2030 será sua implementação. Precisamos da ação de todos, em toda parte. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são o nosso guia. Eles são uma lista de coisas a fazer para as pessoas e o planeta, e um plano para o sucesso”, encerrou o secretário-geral.
A adoção oficial da Agenda de Desenvolvimento Sustentável aconteceu logo depois que o Papa Francisco se dirigiu à Assembleia Geral afirmando: “A adoção da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável na Cúpula Mundial, que abre hoje, é um sinal importante de esperança”.
Veja a programação completa da Cúpula da ONU sobre o Desenvolvimento Sustentável 2015, que acontece até domingo, 27 de setembro, na sede das Nações Unidas, em Nova York.
Informações sobre a nova agenda de desenvolvimento da ONU, os ODS e todos os assuntos ligados à esta questão estão disponíveis em aqui.
O documento oficial que será aprovado na Cúpula – em português – está em aqui.
A cobertura completa sobre este assunto está aqui e aqui.
Mais informações sobre a agenda de desenvolvimento pós-2015, os ODS e a Cúpula aqui.
(ONU Brasil/ #Envolverde/Utopia Sustentável)

domingo, 27 de setembro de 2015

Papa pede ação por mudanças climáticas


"A mudança climática é um problema que já não pode ser deixado para uma futura geração." Foto: U.S. Air Force photo/Tech. Sgt. Robert Cloys
“A mudança climática é um problema que já não pode ser deixado para uma futura geração.” Foto: U.S. Air Force photo/Tech. Sgt. Robert Cloys
Em breve menção ao tema no Congresso dos EUA, o pontífice destacou o papel da atividade humana na degradação ambiental e a necessidade de posicionamento político
Em visita histórica aos Estados Unidos, o papa Francisco clamou por ação contra as mudanças climáticas em seu discurso aberto na Casa Branca e também no Congresso norte-americano. Esta é a primeira vez que um papa discursa aos parlamentares estadunidenses. Em uma declaração abrangente em que falou sobre agendas globais urgentes, como a crise dos refugiados na Síria e o fundamentalismo religioso, o pontífice dedicou um trecho ao desenvolvimento sustentável, citando o papel da atividade humana no esgotamento de recursos naturais.
“Na Laudato Si ‘, eu chamo um esforço corajoso e responsável para redirecionar nossos passos e evitar os efeitos mais graves da deterioração ambiental causada pela atividade humana”, disse. “Estou convencido de que podemos fazer a diferença e eu não tenho nenhuma dúvida de que os Estados Unidos – e este Congresso – têm um papel importante a desempenhar.” Assim como na encíclica Laudato Si’, divulgada em junho deste ano, o papa ressaltou a relação entre degradação ambiental e problemas sociais.
Entre os parlamentares norte-americanos, mudanças climáticas são um tema polêmico, uma vez que os republicanos são em sua maioria céticos sobre o tema. No discurso ao Congresso nesta quinta-feira, o líder católico não citou o termo mudanças climáticas ou aquecimento global, diferentemente da abordagem na sua fala nos jardins da Casa Branca no dia anterior, quando foi assistido por mais de 10 mil pessoas. “Está claro para mim que a mudança climática é um problema que não pode mais ser deixado para as futuras gerações”, disse ontem.
“Eu gostaria que todos os homens e mulheres de boa vontade neste grande país apoiassem os esforços da comunidade internacional para proteger os mais vulneráveis ​​em nosso mundo e para estimular modelos integrais e inclusivos de desenvolvimento.”
As palavras do papa sobre o tema foram ecoadas pelo presidente Barack Obama, que tem trabalhado por mudanças no planejamento energético dos EUA para fontes limpas e reforçado a agenda bilateral do país no tema, em especial com países em desenvolvimento. “Você nos lembra que temos uma obrigação sagrada de proteger nosso planeta, presente magnífico de Deus para nós”, disse Obama ao pontífice, que, por sua vez, elogiou os esforços do presidente na redução de emissões de gases de efeito estufa.
Apesar do pouco destaque ao assunto na fala aos parlamentares, o Guardian apurou que ambientalistas nos EUA estão satisfeitos com a intervenção do pontífice no Congresso. “Apenas por estar aqui, ele está forçando a discussão sobre a mudança climática”, disse Erich Pica, presidente da Friends of the Earth. “A inclinação do papa ao tema é uma tentativa de mudar ainda mais a discussão nos EUA, particularmente no Partido Republicano, e assim conseguir mais conservadores que falam sobre a mudança climática.” (Observatório do Clima/ #Envolverde/Utopia Sustentável)

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Acumular: esporte, hobby ou estupidez?



O ano de 2016 se aproxima e, segundo a organização britânica OXFAN, que reúne 3000 parceiros e atua em cerca de 100 países, será um marco na desigualdade social planetária.  Por quê?

Anualmente, assistimos fóruns econômicos debaterem o tema e lançarem propostas, porém, ações efetivas que reflitam uma melhora na distribuição da riqueza, pouco ou nada têm interferido nas estatísticas que medem esta catástrofe mundial.  E o que vemos é mais concentração.

Segundo a entidade, ano que vem o planeta estará alcançando o ápice da desigualdade com a riqueza acumulada por 1% da população mundial sendo superior a tudo que os demais possuem.  Apesar de produzirmos alimento para três planetas, uma em cada nove pessoas passa fome.  E 1 bilhão de pessoas vive com menos de US$ 1,25/dia.  Mais, a diferença entre a renda dos 99% mais pobres para o 1% mais rico é de, pasmem, 700 vezes.  O estudo revela, ainda, que a partir da crise econômica de 2008 a desigualdade mundial explodiu.   

Winnie Byanyima, diretora-executiva da OXFAN e copresidente do Fórum Econômico Mundial, finaliza o estudo com uma pergunta instigante:  “queremos viver em um mundo no qual 1% tem mais do que nós todos juntos?” A resposta, sob todos os aspectos e lógicas, se feita individualmente para cada um dos 7,2 bilhões de terráqueos, seria óbvia: um retumbante não.   Complementando: o que podemos fazer enquanto sociedades globais para trazer essa discussão à baila, fazê-la aflorar entre nós?


A favor deles (1% mais ricos), a gigantesca e desorganizada aldeia global e suas múltiplas faces e divisões.  De governos, conhecimento, acessibilidade, fronteiras/países, línguas, costumes, culturas.   Por outro lado, os números que retratam os contrastes da vida dos 99% dos terráqueos mais pobres são incontestáveis. 

Ao não estimularmos as sociedades a exercitar (e exigir) um contraponto de prioridades econômicas e sociais de políticas públicas em prol de suas populações (discutindo, propondo, agindo), permitimos, tacitamente, que o abismo se aprofunde e o modus operandi vigente se perpetue.  É a falência do capitalismo.


É notório que governos e governantes, em sua grande maioria, estão sempre à disposição das elites e seus interesses, implementando políticas que visam privilegiar e resguardar o grande capital.  Sempre intocável em qualquer cenário.  Seja no Brasil, na Grécia ou na Espanha.  E é esta visão macroeconômica que tem que ser invertida. 

Por aqui, os insaciáveis de sempre, senhores do capital, comandados pelo capacho-mor dos rentistas, Sr. Joaquim Levy, já escolheram os bodes expiatórios da vez: os velhinhos e suas aposentadorias.  A complementar a estupidez, a criatividade (!!!) de mais impostos.

Doce delírio ou utopia, não custa lembrar aos representantes da elite brasileira, que nunca é tarde para o jogo começar a virar.  Com um pouco de pressão da sociedade e vontade política, bem que podíamos inovar e propor a criação do imposto sobre grandes fortunas e taxar o lucro dos bancos.
 
Se o governo é realmente dos trabalhadores, trabalhar apenas pelas elites, por quê?  Afinal, é ou não hora de exercitar dividir?

Abraços Sustentáveis


Odilon de Barros

Papa pede ação por mudanças climáticas


"A mudança climática é um problema que já não pode ser deixado para uma futura geração." Foto: U.S. Air Force photo/Tech. Sgt. Robert Cloys
“A mudança climática é um problema que já não pode ser deixado para uma futura geração.” Foto: U.S. Air Force photo/Tech. Sgt. Robert Cloys
Em breve menção ao tema no Congresso dos EUA, o pontífice destacou o papel da atividade humana na degradação ambiental e a necessidade de posicionamento político
Em visita histórica aos Estados Unidos, o papa Francisco clamou por ação contra as mudanças climáticas em seu discurso aberto na Casa Branca e também no Congresso norte-americano. Esta é a primeira vez que um papa discursa aos parlamentares estadunidenses. Em uma declaração abrangente em que falou sobre agendas globais urgentes, como a crise dos refugiados na Síria e o fundamentalismo religioso, o pontífice dedicou um trecho ao desenvolvimento sustentável, citando o papel da atividade humana no esgotamento de recursos naturais.
“Na Laudato Si ‘, eu chamo um esforço corajoso e responsável para redirecionar nossos passos e evitar os efeitos mais graves da deterioração ambiental causada pela atividade humana”, disse. “Estou convencido de que podemos fazer a diferença e eu não tenho nenhuma dúvida de que os Estados Unidos – e este Congresso – têm um papel importante a desempenhar.” Assim como na encíclica Laudato Si’, divulgada em junho deste ano, o papa ressaltou a relação entre degradação ambiental e problemas sociais.
Entre os parlamentares norte-americanos, mudanças climáticas são um tema polêmico, uma vez que os republicanos são em sua maioria céticos sobre o tema. No discurso ao Congresso nesta quinta-feira, o líder católico não citou o termo mudanças climáticas ou aquecimento global, diferentemente da abordagem na sua fala nos jardins da Casa Branca no dia anterior, quando foi assistido por mais de 10 mil pessoas. “Está claro para mim que a mudança climática é um problema que não pode mais ser deixado para as futuras gerações”, disse ontem.
“Eu gostaria que todos os homens e mulheres de boa vontade neste grande país apoiassem os esforços da comunidade internacional para proteger os mais vulneráveis ​​em nosso mundo e para estimular modelos integrais e inclusivos de desenvolvimento.”
As palavras do papa sobre o tema foram ecoadas pelo presidente Barack Obama, que tem trabalhado por mudanças no planejamento energético dos EUA para fontes limpas e reforçado a agenda bilateral do país no tema, em especial com países em desenvolvimento. “Você nos lembra que temos uma obrigação sagrada de proteger nosso planeta, presente magnífico de Deus para nós”, disse Obama ao pontífice, que, por sua vez, elogiou os esforços do presidente na redução de emissões de gases de efeito estufa.
Apesar do pouco destaque ao assunto na fala aos parlamentares, o Guardian apurou que ambientalistas nos EUA estão satisfeitos com a intervenção do pontífice no Congresso. “Apenas por estar aqui, ele está forçando a discussão sobre a mudança climática”, disse Erich Pica, presidente da Friends of the Earth. “A inclinação do papa ao tema é uma tentativa de mudar ainda mais a discussão nos EUA, particularmente no Partido Republicano, e assim conseguir mais conservadores que falam sobre a mudança climática.”(Observatório do Clima/ #Envolverde/Utopia Sustentável)

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Como o Brasil vai implantar os ODS?


A fachada do prédio da ONU em Nova York na terça-feira 22, com projeção sobre os ODS. Cia Pak / UN Photo
A fachada do prédio da ONU em Nova York na terça-feira 22, com projeção sobre os ODS. Cia Pak / UN Photo
O desafio maior é inserir a Agenda 2030 nas prioridades das instituições privadas e públicas.

Nesta sexta-feira 25, na sede da Organização das Nações Unidas em Nova York, presidentes e autoridades de alto nível de 193 países, incluindo a inédita presença de um papa, irão discursar sobre a nova Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e lembrar o que representaram os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) na mitigação de graves problemas mundiais.
Na septuagésima sessão da Assembleia Geral da ONU, os Estados membro adotarão a resolução que representa o consenso político possível para, nos próximos 15 anos, tratar graves problemas que afetam o mundo. Erradicar a pobreza, reduzir a desigualdade entre e intra países, atingir equidade de gênero, regular o crescimento desordenado das cidades, acabar com a epidemia de Aids, garantir educação básica para todas as crianças e estancar completamente o desmatamento, fazem parte da lista de compromissos sociais, econômicos e ambientais assumidos nos dezessete Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e suas 169 metas.
Mesmo considerando as dificuldades do processo de negociação do acordo, o maior desafio começa agora, que é o de inserir a agenda de desenvolvimento sustentável nas prioridades das instituições privadas e públicas para que, de fato, seja possível articular políticas nacionais, estaduais e municipais orientadas pelos ODS, ou como será também conhecida, pela Agenda 2030.
E está claro que, neste processo de implementação, a adequação dos orçamentos públicos dos países e a forma como trabalham com a sociedade civil serão dois aspectos fundamentais para o sucesso desta empreitada.
No caso do Brasil, para alocar recursos a partir de 2016 já é necessário agir agora, alinhando o Plano Plurianual, por exemplo, e começando a preparar as estruturas de acompanhamento dos ODS. Este será o principal indicador sobre o interesse sincero do governo em honrar os compromissos assumidos na Assembleia Geral pois, para além dos tradicionais discursos que serão feitos na ONU, é preciso compromisso generalizado do governo no sentido de levar esse debate para todas as comunidades e populações afetadas pelas desigualdades.
Para isso será fundamental mudar a lógica de financiamento e incentivos que fomentam os parâmetros de sustentabilidade.
Neste sentido, uma das expectativas do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil, um coletivo com cerca de 60 organizações que acompanha a agenda do pós-2015, é a criação de uma Comissão Nacional para tratar dos ODS. Esta demanda é fruto de um maduro processo de diálogo e foi apresentada inúmeras vezes por este GT ao governo brasileiro ao longo das negociações da agenda Pós 2015.
Esperamos que esta comissão seja anunciada pela presidente Dilma Rousseff já na sua fala de abertura da Assembleia Geral, e que sua composição contemple espaços múltiplos para participação qualificada da sociedade civil, tenha representações multissetoriais dos governos federal, estaduais e municipais e que, principalmente, tenha eficiência deliberativa.
Outra questão importante é que a disputa com os defensores do utilitarismo neoliberal, que tanto tencionou o processo de negociação, continuará a ser um empecilho, agora na implementação, pois formalmente a Agenda 2030 insiste que o crescimento econômico deve vir acompanhado de distribuição de renda e respeito ao meio ambiente e às populações vulneráveis – abordagem visivelmente distante do contexto brasileiro.
Mas esta é a solução exigida não apenas para o Brasil, mas para todos os países frente ao diagnóstico de que as políticas alinhadas à desregulação financeira, ao endividamento público, ao aumento da poluição causada por emissão de gases orgânicos, à expansão da desigualdade social, ao aumento da pobreza, às guerras, à fome, entre tantos outros desequilíbrios contemporâneos, não estão funcionando.
De fato, os dados produzidos pelas agências da ONU, por organizações da sociedade civil e pela academia apontam que, se não houver uma mudança global urgente de paradigmas nas gerações atuais, o futuro das próximas gerações estará comprometido de forma irremediável. O mantra atual nos corredores e salas de reunião da ONU é de que, por exemplo, “esta é a última geração que pode fazer alguma coisa para reverter as causas das mudanças climáticas”, um problema que, finalmente admitiu-se, é efeito colateral do modelo de produção e consumo dominante do mundo.
Para entender a crítica sobre o ‘modelo’, basta observar como os padrões de desejo foram se tornando hegemônicos, condicionando o significado social do indivíduo, capturando as subjetividades frente a simbologias repetidas em cada espaço social, reproduzidas em uma imensa rede de canais em que mensagens subliminares – comprar, adquirir, acumular para depois descartar e repor – é na prática o coração do crescimento econômico a-qualquer-custo para se alcançar esse tipo de ‘prosperidade’.
Em nome de cifras macroeconômicas e prazeres individuais, vidas e territórios são atropelados pela cadeia de fornecimento global (Global Supply Chain) – pouco regulada e nada transparente – para a dinamização dos centros de consumo do mundo.
A importância dessa resolução a ser aprovada pela ONU é que ela dialoga diretamente com a realidade atual do planeta, dos países e das pessoas, caracterizada por desarranjos sociais, econômicos e ecológicos, algo sem precedentes na história recente. E propõe soluções possíveis frente à percepção de que todas as crises se acumulam e se sobrepõem, impulsionadas por uma multiplicidade dos interesses de países, grupos e pessoas poderosas para a manutenção de suas posições hegemônicas.
Um dos exemplos dessa queda de braço entre países desenvolvidos e os países em desenvolvimento, no contexto da Agenda 2030, foi o processo de negociação da terceira Conferência Internacional de Financiamento para o Desenvolvimento, realizada em julho, em Addis Ababa, Etiópia.
A Conferência, parte do processo pós-2015, deveria ter resultado na identificação das fontes de recursos e meios de implementação dos ODS, estimada atualmente entre 3 e 6 trilhões de dólares por ano. Mas, apesar de a conferência ter pautado a criação de um mecanismo de facilitação tecnológica e de um sistema para seguimento de sua implementação, ela não indicou as fontes de financiamento adicionais para o desenvolvimento sustentável.
Sem clareza sobre de onde sairão os recursos financeiros além dos mecanismos atuais de cooperação e investimentos diretos, claramente insuficientes, abriu-se a porta para que a iniciativa privada seja protagonista em serviços e infraestrutura, que antes eram responsabilidades do Estado.
A questão aqui é que já temos exemplos de como parcerias-público-privadas funcionam no Brasil. Por isso, implementar a Agenda 2030 vai demandar um monitoramento rigoroso dessas parcerias para realmente colocar a sustentabilidade no cerne desse formato de contratualismo político e econômico.
A agenda para o desenvolvimento sustentável também, ao contrário do que se anuncia e se pratica no Brasil, clama aos países adotarem políticas tributárias progressivas, buscando desonerar a população com redução de impostos regressivos sobre o trabalho e a produção.
Mesmo a Agenda de Ação resultante de Addis Ababa sugere buscar mecanismos inovadores de financiamento, ainda que não explicite que os tributos sobre transações financeiras no mercado de capitais é uma das medidas mais indicadas.
Assim, implementar os compromissos acordados nos próximos 15 anos vai exigir coragem de todos os países porque o modelo da economia mundial há muito vem se consolidando como uma ditadura financeira. Os orçamentos públicos dedicam a maior fatia dos recursos para cobrir juros de dívidas crescentes, enquanto políticas de austeridade e redução de investimentos diretos esfriam as atividades econômicas, colocando em risco a estabilidade dos países e comprometendo a empregabilidade de gerações futuras.
No Brasil, frente à atual crise econômica, o governo federal precisa trabalhar com a ideia de justiça fiscal e progressividade tributária como a célula nevrálgica tanto para a mobilização de novos recursos, como para dar continuidade à redução de desigualdades sociais e econômicas, inclusive com diminuição de riquezas extremas.
Isto seria o início de uma possível democracia econômica promovida pelo poder soberano do Estado em coletar e alocar recursos públicos de forma justa, eficiente e responsável.
O compromisso da Agenda 2030 está pactuado na ONU, mas seu resultado só o tempo e os indicadores dirão. E neste caso dirão mesmo, pois a Agenda tem um processo de monitoramento que inclui a sociedade civil. O desafio não é pequeno, o trabalho enorme e, somente em conjunto, será alcançado a contento.** Publicado originalmente no site CartaCapital/Utopia Sustentável.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Lei florestal zeraria desmate na Amazônia


Foto: André Villas Bôas/ISA
Foto: André Villas Bôas/ISA
Estudo do Inpe que subsidiará meta de Paris indica que desmatamento zero na floresta é viável, mas prevê emissões de 240 milhões de toneladas de gás carbônico por uso da terra em 2030

Pelo menos na Amazônia, o desmatamento zero em 2030 não só é possível, como é a consequência natural do cumprimento efetivo do Código Florestal. A conclusão é de um estudo do Inpe, encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente e entregue à ministra Izabella Teixeira. Ele vai subsidiar a INDC, sigla pela qual é conhecido o plano que o Brasil deverá apresentar à ONU no fim desta semana para o acordo do clima de Paris.
O estudo projeta a evolução do uso da terra no Brasil entre 2000 e 2050 a partir de um modelo computacional que simula fatores como o comportamento dos mercados de commodities e diversos cenários de cumprimento da lei de florestas.
Uma de suas conclusões é que, se o código for seguido à risca, inclusive no que tange à restauração florestal, a quantidade de florestas na Amazônia deve cair até 323 milhões de hectares em 2020 e aumentar em 5 milhões de hectares na década seguinte, estabilizando-se em 328 milhões de hectares a partir de 2030.
“Isso indica que o Código Florestal, por si só, é capaz de produzir um efeito de ‘desmatamento zero’ na Amazônia”, afirma o relatório, que deve ser disponibilizado na internet nos próximos dias.
Mesmo assim, o cerrado teria perdas significativas de vegetação nativa, entre áreas florestadas e de campos naturais e vegetação rala. Só para a agricultura o bioma perderia 35 milhões de hectares, o equivalente a uma Alemanha. E a caatinga perderia 40% de sua vegetação – em todos os cenários, é o único bioma no qual o desmatamento não se estabilizaria após 2050.
Além disso, como a recomposição de uma floresta desmatada precisa de muito mais área do que o que foi perdido para compensar as emissões de carbono, mesmo com a estabilização do desmatamento líquido na Amazônia, o país ainda chegaria a 2030 emitindo cerca de 240 milhões de toneladas de CO2 por mudança de uso da terra. Há uma possibilidade de essa cifra estar na INDC brasileira.
O novo estudo faz parte do projeto Redd-Pac (Centro de Avaliação de Políticas de Redd+), financiado pelo governo alemão e com participação de centros de pesquisa do Brasil e da África. Ele foi coordenado por Gilberto Câmara, ex-diretor do Inpe e um dos pais do sistema de monitoramento do desmatamento em tempo real, o Deter.
Ele utiliza um modelo computacional alemão chamado Globiom, adaptado ao Brasil por um grupo do Inpe e do Ipea. Ele assume que, onde houver disponibilidade de terra, demanda e condições econômicas e logísticas, haverá conversão de vegetação nativa para a produção. “É um modelo neoliberal”, brinca Câmara.
A essa base econômica estritamente racional foram sobrepostos mapas de vegetação e dados como projeção de população e tamanho do rebanho bovino no país. Em seguida, executadas simulações de várias situações de aplicação do Código Florestal: a lei tal qual ela existe, a lei sem anistia à recomposição da reserva legal em propriedades de até quatro módulos fiscais (400 hectares) e a lei sem a chamada cota de reserva ambiental, ou CRA.
A anistia à recomposição de reserva legal foi uma das principais bandeiras da bancada ruralista para mudar a lei de florestas. A alegação era que a exigência de repor áreas desmatadas ilegalmente até 2008 inviabilizaria a maior parte das propriedades rurais do Brasil. O expediente, porém, está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal (o estudo do Inpe é chama-o pelo nome, “anistia”, termo que o governo rejeita).
A CRA é um instrumento de flexibilização do código, pelo qual um proprietário que tenha desmatado além do permitido em sua fazenda pode compensar esse desmatamento comprando cotas para que outros fazendeiros no mesmo bioma preservem além do exigido pela lei.
O Globiom mostra que a CRA pode ter um efeito perverso, em especial na caatinga e no cerrado: se for adotada sem políticas adicionais, ela pode desestimular a recuperação de 2 milhões de hectares apenas neste último. Na Amazônia isso pode adquirir proporções dramáticas caso mais de 20% das terras devolutas do Estado do Amazonas sejam entregues a proprietários privados. “Ninguém precisaria reflorestar nada”, diz Gilberto Câmara.
Segundo as projeções do Globiom, sem anistia e sem CRA a recuperação de florestas poderia ser significativa: quase 30 milhões de hectares, mais do que o dobro dos 12 milhões de hectares que Dilma Rousseff se comprometeu a recuperar, na declaração conjunta com os Estados Unidos. Num cenário com CRA apenas para a agricultura (não para a pecuária), essa área cai para 21 milhões de hectares – mesmo assim, mais do que o Brasil se comprometeu a fazer, o que indica que, pelo menos no modelo, há espaço para mais ambição também aqui.
INDC
Se as emissões do desmatamento ainda estarão na casa das 240 milhões de toneladas de CO2 em 2030, mais conservadora ainda é a projeção do Globiom para a agropecuária: nesse setor, que hoje responde por um terço das emissões brasileiras, as emissões em 2030 seriam de 465 milhões de toneladas – cerca de 15% a mais do que em 2010.
O modelo prevê que a área de pastagens terá pouco crescimento no Brasil nas próximas décadas. As emissões não caem, porém, porque não se considerou que o tamanho do rebanho ou a eficiência da pecuária vão sofrer mudanças significativas – a emissão de metano por cabeça de boi, por exemplo, não mudaria nos cenários considerados. Também não se considerou uma expansão relevante do plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono), que se propõe a recuperar pastagens degradadas e fixar carbono no solo.
Câmara admite que é possível ousar mais nesse setor. “O nosso modelo é de fato conservador com a dieta animal e admito que pode haver uma redução adicional de pastagens. Mas tenho de rodar o modelo com as condições que eu tenho.”
Noves fora, a crer nos resultados do estudo do Inpe, as emissões brasileiras de uso da terra e agricultura somariam o equivalente a 705 milhões de toneladas de CO2.
Isso daria margem ao crescimento das emissões em outro setor onde o governo considera mais difícil mexer: o de energia, que passaria a dominar a curva de emissões do Brasil.
Segundo projeções feitas por Câmara (que não estão incluídas no estudo do Redd-Pac), em 2030 esse setor emitiria 568 milhões de toneladas (aumento de 55% em relação a 2010). Somando-se isso a processos industriais (148 milhões de toneladas de CO2) e resíduos (81 milhões de toneladas), no total, o país chegaria a 2030 emitindo cerca de 1,5 bilhão de toneladas de CO2 equivalente – mais ou menos o que já emite hoje.
A meta de chegar a 2030 mantendo os níveis de emissão de 2013 seria politicamente palatável na negociação internacional. O Brasil poderá alegar que é um país “em desenvolvimento no âmbito da Convenção do Clima”, ou seja, suas metas não poderiam ter o mesmo rigor das dos países desenvolvidos – que, de resto, excluindo a União Europeia, têm apresentado INDCs muito pouco ambiciosas. Poderá também dizer, como a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) não se cansa de lembrar, que fez mais do que a maioria dos outros países para cortar emissões, reduzindo o desmatamento.
Por fim, o Brasil teria nos outros emergentes parceiros ideais na baixa ambição: a China apresentou um plano que prevê aumento brutal nas suas emissões e um “pico” ao redor de 2030; a Índia flerta com uma meta relativa – de reduzir a intensidade de carbono de sua economia; e a África do Sul, cuja INDC está em consulta pública, prevê um aumento de emissões até 2030 e um declínio somente a partir de 2036.(Observatório do Clima/ #Envolverde/Utopia Sustentável)