segunda-feira, 31 de março de 2014

Conheça as sete vantagens econômicas de um Green Building


O Brasil está passando por um período de estresse hidráulico e energético e o risco de racionamento ainda não foi totalmente descartado. Se for levado em consideração que os edifícios são responsáveis por 45% do consumo anual de energia de todo o País, 22% da emissão de CO2 e 21% do consumo de água potável do Brasil, trabalhar em edifícios sustentáveis ou green buildings é uma vantagem de mercado importante. Isso porque as edificações são projetadas para economizar até 30% de energia e 35% no uso da água.

O edifício Panorama Paulista Corporate, por exemplo, foi inaugurado em 1975 e acaba de passar por um retrofit completo (processo de readequação da construção existente) para se tornar o primeiro edifício sustentável da região da Avenida Paulista. De acordo com Greco Paolo, incorporador do empreendimento, em razão do crescimento da demanda por água e energia, utilizar os recursos naturais de forma consciente tornou-se fundamental atualmente.

Conheça as sete características que fazem do Panorama Paulista Corporate um Green Building:

1 - Vidros de alta eficiência. A nova fachada com vidros de alta eficiência proporcionam uma economia de 13% no consumo de energia por absorver menos calor e não sobrecarregar o sistema de climatização.

2 - Ar-condicionado de terceira geração. Reduz gastos com eletricidade em 20%.

3 - Sistema hidráulico. Projetado para reduzir em 30% o consumo de água.

4 – Reutilização da água. Uso da água descartada pelo ar-condicionado serve para a irrigação dos jardins.

5 – Iluminação natural. No edifício não é necessário acender as luzes antes das 17h por causa do projeto de iluminação, que aproveita ao máximo a luz solar.

6 – Medidores de água e energia individual. Com um medidor em cada andar, permite ao locatório a medição de energia por uso, sendo possível, dessa forma, identificar quais são os maiores gastos.

7 – Seguir padrões ecológicos de certificação. Hoje, o empreendimento segue os padrões LEED (Leadership in Energy and Enviromental Design) Core & Shell, selo concedido pela organização não governamental americana United State Green Building Council (USGBC) para construções sustentáveis.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Estudo aponta que a falta de saneamento básico impacta na educação




saneamentobasico 300x199 Estudo aponta que a falta de saneamento básico impacta na educação
A falta de saneamento afeta a higiene de meninos e meninas, como ocorre com esse esgoto a céu aberto em Madagascar. Nas cidades brasileiras a área da educação também sofre impactos negativos. Foto: Lova Rabary-Rakontondravony/IPS
O estudo Benefícios econômicos da expansão do saneamento brasileiro, publicado no último dia 19 pelo Instituto Trata Brasil e pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável – CEBDS, apontou que a falta de saneamento básico nas cidades brasileiras afeta várias áreas, entre as quais, saúde, trabalho e renda, imóveis, turismo e educação.
Segundo o relatório, a falta de água tratada e de esgotamento sanitário causa grande impacto no aprendizado de crianças e jovens do país. Doenças provocadas pelo consumo de água contaminada, como as infecções gastrointestinais, que ocasionam diarreia e vômito, levam a queda no rendimento dos alunos.
Em média, estudantes sem acesso a esses serviços básicos têm atraso escolar maior do que aqueles com as mesmas condições socioeconômicas, mas com acesso ao saneamento. A universalização do acesso à coleta de esgoto e à água tratada, de acordo com a pesquisa, reduziria em 6,8% o atraso escolar, o que possibilitaria o aumento da escolaridade média do brasileiro nos próximos anos, com efeito sobre a produtividade no trabalho e na renda.
Contexto – o Brasil ocupa a 112ª posição em um ranking de saneamento entre 200 países. Sua pontuação no Índice de Desenvolvimento do Saneamento é inferior às médias da América do Norte, da Europa e de alguns países do Norte da África e do Oriente Médio, onde a renda média da população é menor do que a renda dos brasileiros. De acordo com estimativa do estudo, mais de 14 milhões de moradias não têm água encanada e cerca de 35 milhões de pessoas vivem sem coleta de esgoto no Brasil. Para levar o saneamento básico para 100% da população, o país precisa investir pouco mais que 300 bilhões de reais até 2033.** Publicado originalmente no Blog Educação.

quinta-feira, 27 de março de 2014

2,5 bilhões de pessoas não têm acesso a saneamento básico em todo mundo





aguasaneamentobasico 2,5 bilhões de pessoas não têm acesso a saneamento básico em todo o mundo
Foto: ONU-Água

A água, a energia e a segurança alimentar estão estritamente ligadas, já que o cuidado com os recursos hídricos é um ponto importante no avanço da luta contra a fome, ressaltou na sexta-feira (21) a FAO.
No dia 22 de março comemorou-se o Dia Mundial da Água. Esse ano o foco é o nexo entre a água e a energia, um aspecto-chave quando se considera que entre todas as energias renováveis a hidrelétrica é a mais representativa, com 16% de todas as fontes energéticas atuais.
“Temos que compreender a interdependência que existe entre a água, a energia e a segurança alimentar, 75% do uso industrial da água é destinado a geração de energia. Se não gerenciarmos de maneira sustentável este recurso vital, não vamos conseguir avançar na erradicação plena da fome”, assinalou a representante regional adjunta da FAO, Eve Crowley.
Estima-se que 780 milhões de pessoas no mundo carecem de acesso a água potável e 2,5 bilhões de serviços de saneamento, além de 1,3 bilhão de pessoas não ter acesso a eletricidade.
Estima-se que a demanda global por água pode ultrapassar em 44% os recursos disponíveis anuais em 2050 e a demanda de energia poderá aumentar em 50% de hoje até essa data. Em termos de uso, a agricultura representa a principal fonte de consumo de água doce (70%), sendo o resto para uso doméstico (17%) e industrial (13%).
A água e a energia na América Latina e no Caribe
Na América Latina e no Caribe existe uma pressão crescente dos recursos hídricos por fatores climáticos como as secas e as inundações e por atividades econômicas que precisam de muita água, como a mineração e a agricultura.
Ainda existem 35 milhões de pessoas na região sem acesso a fontes de água potável e cerca de 100 milhões sem saneamento básico. De acordo com o Banco Mundial, na América Latina, 45% da água é perdida antes de chegar ao consumidor.
Apesar de ser uma região rica em recursos energéticos como hidrocarbonetos, energia hidrelétrica e biocombustíveis, esta riqueza está igualmente má distribuída: aproximadamente 34 milhões de pessoas carecem de acesso aos serviços modernos de eletricidade.
Sem energia não há água e sem água não há energia
A água precisa de energia para ser purificada, transportada, pressurizada e depurada, enquanto a maior parte dos processos de produção de energia necessitam de água para a refrigeração, extração, entre outros. Trata-se de dois recursos intimamente ligados e que impactam os sistemas alimentares.
A FAO orienta que os governos devem criar políticas energéticas que levem em consideração os nexos existentes entre a produção de alimentos, a geração de energia e a sustentabilidade dos recursos hídricos. Publicado originalmente no site ONU Brasil.

A possível cidade sem agrotóxicos



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No Rio, produtores familiares vencem preconceitos, organizam feiras orgânicas e revelam que, mesmo nas metrópoles, outra agricultura é possível
Alimentar mais de 11 milhões de habitantes da Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro (RMRJ)2 é uma empreitada complexa e desafiadora. A segunda maior área metropolitana do Brasil, também conhecida como Grande Rio, é formada por 19 municípios3. A região foi estabelecida por meio de decreto (Lei Complementar Federal nº 20) em 1º de julho de 1974, após a fusão entre os antigos estados do Rio de Janeiro e da Guanabara. Em 2014, a lei completará quarenta anos, e a data é oportuna para pensar o lugar da Agricultura Familiar na cidade, quais estratégias estão em desenvolvimento para abastecer a população com alimentos locais e saudáveis.
De acordo com o Censo Agropecuário de 2006, a região possui cerca de cinco mil empreendimentos familiares com atividade agrícola. Entretanto, a busca de alternativas ao atual modelo de produção e consumo, baseado na agricultura convencional, com uso intensivo de agrotóxicos, tem mobilizado uma rede de pessoas interessadas em repensar o abastecimento na cidade. Há um consistente exercício em estreitar os vínculos entre os cidadãos que plantam e os que consomem.
As iniciativas em curso, como a Feira da Roça de Nova Iguaçu e a Coopagé, são acompanhadas pelo Programa de Agricultura Urbana da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia e são parte das ações desenvolvidas pelo Projeto Alimentos Saudáveis nos Mercados Locais com o Patrocínio da Petrobras por meio do Programa Desenvolvimento & Cidadania. Estas iniciativas buscam criar espaços comuns de convivência, comercialização e aprendizado. As feiras agroecológicas têm se constituído um ambiente oportuno por mediar a relação entre agricultores e consumidores. Estratégias denominadas de “circuitos curtos de comercialização”, “mercados de proximidade”, “sistemas regionais de alimentos” e “redes agroalimentares alternativas”, surgem como soluções para engajar os moradores do campo e da cidade, com o propósito de preservar um bem comum: o alimento.
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Desagriculturização
Na década de 1990, a RMRJ era líder no Estado em área plantada e produção. O processo de urbanização desordenado encolheu as áreas destinadas às lavouras, apesar de ainda persistir um contingente expressivo de agricultores, responsáveis pela produção de grande parte de legumes, verduras, raízes, tubérculos e frutíferos. De 1970 a 2006, a utilização de terras produtivas em todo o estado fluminense passou de 629 mil a 349 mil hectares, reduzindo-se quase à metade4. O pesquisador Paulo Alentejano5 enumera alguns indicadores do fenômeno chamado de desagriculturalização6: o esvaziamento do meio rural, a ampliação da concentração fundiária e a redução da importância da agricultura, seja em relação à produção, à área e, principalmente ao emprego.
A pesquisadora Juliana Arruda7, que estudou a agricultura urbana na Região Metropolitana, sugere que essa produção não é percebida pela população consumidora, principalmente em função da visão de que no estado não existe agricultura, e que todo o alimento é oriundo de outras regiões. Essa percepção é refletida no próprio planejamento da cidade, chamado de Plano Diretor, que é um instrumento básico da política de desenvolvimento dos municípios e estados. A função é orientar a atuação do poder público e da iniciativa privada na construção dos espaços urbano e rural. Com a intensa urbanização, os planos de alguns municípios excluíram a zona rural do documento, acarretando ainda mais dificuldades para a manutenção da atividade agrícola.
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O município do Rio de Janeiro, por exemplo, é considerado integralmente urbano (Lei Municipal Complementar n. 111/2011). Com isso, a Agricultura Familiar enfrenta sérias dificuldades para escoar a produção em feiras, mercados e programas de compra institucional de alimentos, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA); e obter certificações e financiamentos. Ora, se o entendimento, conforme o Plano Diretor, é de que não existe área rural, esses agricultores ficam impossibilitados de exercer sua atividade plenamente. “É preciso repensar o papel que a agricultura cumpre nos municípios da RMJR, pois esta visão se reflete nos planos diretores”, explica Marcio Mendonça, coordenador do Programa de Agricultura Urbana, da AS-PTA.
Novos planos
Alguns municípios da RMRJ revisaram seus Planos Diretores e incluíram novamente a zona rural. Um dos casos é o de Nova Iguaçu. Em 1997, o município foi transformado em um único distrito, mantendo apenas uma pequena reserva verde. Segundo Mariela Rosa, engenheira agrônoma da Emater e coordenadora da Escolinha de Agroecologia de Nova Iguaçu, a justificativa dada pelo governo foi evitar a emancipação dos distritos, como aconteceu com Mesquita, Queimados e Japeri, que pertenciam a Nova Iguaçu. “Com essa mudança no final da década de 90 não foi possível investir mais na agricultura local, captar recursos financeiros e até obter transporte escolar para os alunos que residem no campo. Os agricultores também passaram a receber cobrança de IPTU”, explica Rosa. Ao invés de promover o desenvolvimento integrado, essas orientações reforçam a invisibilidade do trabalho e do trabalhador rural.
Em 2006, agricultores mobilizados junto aos movimentos sociais e organizações não-governamentais reivindicaram a alteração do zoneamento no plano. Durante os nove anos que se passaram, a Agricultura Familiar foi retirada do papel, mas permaneceu na terra, resistindo. Mariela afirma que ainda há muito trabalho a fazer no município. Uma das estratégias de (re)ocupação da cidade foi a criação da Feira da Roça, em 1999. É umainiciativa de organizações da sociedade civil, com envolvimento da Comissão Pastoral da Terra e do Fórum de Cooperativismo Popular de Nova Iguaçu. A Feira conta ainda com o apoio da Emater, Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu e da AS-PTA.
Durante os quinze anos de existência, a feira passou três anos sem funcionar e ainda enfrentou períodos conturbados, a cada mudança de governo. Por isso, a Associação da Feira da Roça de Nova Iguaçu (AFERNI) está agora pleiteando para a feira o título de Patrimônio Histórico do Município. Na Feira da roça, cerca de trinta famílias de agricultores e artesãos exibem uma fartura de alimentos e produtos. Tem jaca, jenipapo, castanha de sapucaia, açaí, carambola, acerola, pitomba, aipim, quiabo, abacaxi, pimentas, queijos, linguiças, remédios fitoterápicos, receitas variadas de bolos, sucos, doces e compotas, licores, vinagres, banana chips e tapioca Tudo de acordo com a época. A visita a essas feiras é uma maneira de o consumidor aprender a sazonalidade do alimento, e ver na prática que morangos não dão o ano inteiro – é preciso substituí-los pelos sabores da temporada. Este é o princípio de uma alimentação diversificada, em sintonia com o ciclo de plantio, mais saborosa, com preços mais acessíveis, e que fortalece a economia local. A Feira da Roça acontece às quartas-feiras, na Praça Rui Barbosa, no centro de Nova Iguaçu, das 8h às 17h.
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Ivonete da Silva e Silva, de 60 anos, cresceu acompanhando sua mãe que foi a fundadora da feira livre de Areia Branca, em Belford Roxo. Hoje, junto com o marido, cuida do sítio em Jaceruba, em Nova Iguaçu. Com satisfação, ela se apresenta como agricultora rural, e diz que antes de participar da Feira da Roça, ficava incomodada pela maneira que seu ofício é visto por boa parte da sociedade. “Tinha vontade de gritar que a agricultura existe, que é uma coisa maravilhosa, coisa de Deus. As pessoas vivem nesse mundo sem saber valorizar o agricultor rural. Chamam a gente de roceiro e de matuto, mas não sabem que temos a preocupação de manter o nosso sustento e de outras pessoas, com comida saudável, sem veneno”, afirma Ivonete. Ela espera que a atenção dada à Agricultura Familiar seja cada vez maior, por conta dos esforços dos próprios trabalhadores, organizados em cooperativas e associações, e apoio político. “Muitos ainda estão escondidos no meio do mato, que ninguém alcança. Espero que eles sejam alcançados e valorizados”, defende.
Caminho aplainado
O contexto de Magé se destaca pelo fato de o município possuir uma Secretaria de Agricultura Sustentável e um distrito agrícola, que é Rio d’Ouro. O município do Rio de Janeiro, por exemplo, não possui essa secretaria. A Feira da Agricultura Familiar teve início em 2012, com a participação de cerca de trinta agricultores, que se reúnem aos sábados no centro de Piabetá, das 8h às 13h. A visita à feira é estimulante: uma vitrine viva do que se encontra na região, como uma batata doce cor de cenoura e a tradicional batata doce roxa, taioba, inhame, cará, quiabo, jaca, acerola, e banana da terra. Palmito pupunha e açaí são culturas que têm ganhado espaço na região, devido às oportunidades de novos negócios.
Aloisio Sturm, secretário municipal de Agricultura, está há 46 anos em Magé e foi o primeiro agrônomo a chegar na área. “Boa parte da agricultura na região é familiar. A feira sempre foi um sonho. A nossa linha de atuação é unir forças”, explica o secretário, que está presente na feira semanalmente. O agricultor Oswaldo Francisco, primeiro tesoureiro da Cooperativa dos Pequenos Produtores Rurais e Agricultores Familiares do Município de Magé (Coopagé) conta que a feira estava no papel há vinte anos. “Minha paixão sempre foi a lavoura. Além de matar a minha fome, estou matando a dos outros também”, declara, e acrescenta que a feira é uma irmandade, por conectar a terra e a cidade.
Vendendo nas feiras, as mulheres acima dos quarenta são presença forte. Muitas vão com os esposos e filhos. Rosiane Maier, de 44 anos, gosta de comer o palmito que cultiva no seu sítio cozido ou assado, temperado com azeite e orégano, e aprecia a farofa de banana da terra, que colhe pessoalmente. Na feira, ela diz que aprende novidades, como a lidar com o público e apresentar os tesouros culinários de sua região. Ela explica que a lavoura é o meio de vida que lhe foi possível, mas tem paixão pelo que faz. “Não sou roceira, sou agricultora”, avisa.
Também encontramos os filhos dos agricultores, como Camila Takaki, de 21 anos, que ajuda na feira e participa das reuniões da Coopagé, quando não está estudando. “As pessoas que trabalham na agricultura não têm uma renda boa, por isso é importante o apoio das políticas públicas. Muitos estão buscando emprego no Rio e deixando a terra porque a parte financeira não é favorável, mas com incentivo, dá mais ânimo aos trabalhadores”, explica a jovem.
Há também idosos como o senhor Sebastião, de 78 anos, que passa o tempo na feira calado, descascando o aipim com as mãos, numa habilidade que chama a atenção. Para ele, a feira é o lugar certo para escoar sua produção. Rapidamente, Sebastião faz a conta: uma caixa de aipim custa de R$ 30 a R$ 40 para ser comercializada para a Central de Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro (Ceasa). Na feira, ganha o dobro. Ele que também trabalha em feira livre, comenta que há muita concorrência, a mercadoria é desvalorizada e o alimento é tratado de qualquer maneira, diferente das feiras agroecológicas.
Para Márcio, da Associação Agricultura Familiar e Agroecologia (AS-PTA), a agricultura perirubana cumpre uma função importante na cidade. Muitos desistiram da lavoura, mas os que resistiram adotam estratégias de convivência entre o rural e o urbano. “Essas experiências indicam que existem novas regras de convivência para pensar o abastecimento. As feiras extrapolam as relações de mercado. Os consumidores têm a oportunidade de entender o que representa o trabalho no campo. Com isso, há a possibilidade do resgate da agricultura familiar e sua reinserção no plano da cidade”, justifica.
A agroecologia cultiva relacionamento, vínculo, afeto, cultura, direitos e renda. Quanto maior o incentivo, mais íntimos os cidadãos da Região Metropolitana ficarão de sua terra, de sua gente, de sua identidade. E quanto mais conhecerem, maior será o apetite para escolhas conscientes e autônomas. Por sua vez, mais consistência ganhará a rede de pessoas que poderão influir na tomada de decisões sobre o desafio de alimentar a metrópole.
2 Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
3Anuário Estatístico 2012, Fundação CEPERJ.
4Censo Agropecuário de 2006.
5 “Reforma agrária, território e desenvolvimento no Rio de Janeiro” (CPDA/UFRRJ, 2003).
6 RIBEIRO, Ana Maria Motta, PRATA Fº, Dario de Andrade de, PEREIRA, Mônica Cox de Britto & MADEIRA Fº, Wilson. Laudo multidisciplinar e termo de cooperação técnica para convivência harmoniosa de assentamentos rurais no entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas. Niterói, Silva Jardim e Casemiro de Abreu: UFF/MMA/MDA, 2002.
7 Agricultura urbana na Região Metropolitana do Rio de Janeiro: sustentabilidade e repercussões na reprodução das famílias. Tese de doutorado. UFRRJ, 2011.
Juliana Dias é editora do site “Malagueta – palavras boas de se comer” (www.malaguetanews.com.br), mestre em Educação em Ciências e Saúde pelo NUTES/UFRJ, e doutoranda em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia, na UFRJ. Pesquisa sobre alimentação, cultura e sociedade, tendo como eixo as áreas da educação e comunicação. É co-líder da associação Slow Food, no Rio de Janeiro, e membro do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea-Rio).
** Publicado originalmente no site da Associação Agricultura Familiar e Agroecologia (AS-PTA): www.aspta.org.brno e retirado do site Outras Palavras.

terça-feira, 25 de março de 2014

Afinal, a inteligência é prejudicial ao homem?


Prévia do relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas que sairá dia 31 de março próximo, é o mais impactante escrito até hoje.  Segundo cientistas da ONU presentes em Yokohama para a divulgação do trabalho, o quadro é sombrio e deixa claro a certeza inquestionável de que o homem é o grande responsável por tudo que está começando a ocorrer - agora de forma mais intensa - com nosso Planeta.

Ainda segundo o estudo, até 2100 assistiremos ao aumento de 26 a 82 cm do nível do mar, bem como, também, de 0,3 a 4,8 graus da temperatura sobre a Terra.  E nós, até agora, abastados ou não, impávidos e incrédulos, não estamos acreditando nisso. 

Mas o que falta para a Governança Global efetivamente entender que está passando da hora implementar ações que inibam tal catástrofe? Será que somos tão míopes e egoístas e não enxergamos que estamos deixando para nossos filhos e netos um Planeta destruído e totalmente diverso daquele a que fomos apresentados poucas décadas atrás?  De que adiantará acumular milhões, bilhões, se só temos uma única vida para gastar?  E se tudo virar cinzas ou água, terá valido tamanha estupidez?

Sabemos que a capacidade de raciocínio é inerente apenas à espécie humana e que o reino animal obedece apenas a estímulos do instinto, porém, já me peguei várias vezes comparando atitudes do bicho homem e dos demais animais de seu reino.  

Enquanto o homem branco mata, tem necessidade de acumular, trai, priva o semelhante de liberdade, passa fome, é seu próprio escravo, observamos que no reino animal tudo é mais simples e duradouro. Exemplo claro disso acontece com os índios.  Se verificarmos tribos que vivem de sua cultura, interiorizadas na mata e seus habitats naturais, sem a proximidade do homem e próximos apenas dos animais, vamos observar que suas vidas serão muito próximas a de seus vizinhos irracionais. 

Contudo, bastará a aproximação deles com a civilização e o homem branco para que todo o ideal sustentável seja esquecido e passe a vigorar a ganância, o uso de drogas, a chegada de doenças e todos os malefícios inerentes a esse tipo de contato.

A humanidade vive hoje entre o dilema de acreditar ou não que pode desaparecer se continuar a agir dessa forma.  Lendo alguns relatórios de sustentabilidade que informam que a renda de 85 indivíduos no Planeta é igual a de 3,5 bilhões  ou metade de todos os humanos na face da Terra; que continuamos a desmatar nossas florestas, que 820 milhões de “indivíduos” passam fome e vivem em extrema miséria; que por ano milhares de espécies simplesmente desaparecem em função de nossa ação, constato que tudo não passa de história da carochinha, afinal, pensamos.  Ou não?

Abraços Sustentáveis

Odilon de Barros

Tem água de graça em Paris – e talvez, no Rio




Na capital parisiense, fontes públicas fornecem água gratuitamente em toda a cidade. Lei obriga restaurantes do Rio a fazerem a mesma coisa, mas ainda não é cumprida
Turistas brasileiros que visitam a França costumam ficar surpresos quando o garçom de um café ou restaurante coloca uma jarra de água sobre a mesa. A pergunta mais frequente é: “Dá para beber isso?” O costume de servir água de graça, juntamente com a refeição, é muito comum por lá. Muitas vezes o cafezinho vem com um copo de água e, quando isso não ocorre, o cliente pode pedir esse acompanhamento. A água não é cobrada e isso, evidentemente, evita o uso excessivo do plástico. Mais estranho ainda para um brasileiro é descobrir que, na rua ou em parques, pode-se beber a água das fontes localizadas nos jardins e nas praças.
Um mapa editado pela Eau de Paris (Água de Paris), empresa pública responsável pelo fornecimento de água na capital francesa, mostra a localização de mais de 1.200 bebedouros públicos na cidade. Alguns são antigos, como os 101 bebedouros ou fontes Wallace que existem desde o século 19. Outros extraem o líquido do aquífero subterrâneo de Albión. Pode-se achar inclusive água com gás (uma forte rival para empresas desse setor). A maioria dessas fontes têm hoje um design moderno ou artístico.
Perguntamos a Elisabeth Thieblemont, assessora de comunicação da Eau de Paris, qual era o custo do serviço para a empresa. “Não sabemos. A gente nunca se questionou sobre isso, nem fizemos esse cálculo. Oferecer água na rua é parte de um serviço público. Não vemos a água como uma mercadoria”, respondeu, um pouco chocada. De acordo com um estudo realizado a pedido da Eau de Paris em outubro de 2011 pelo Ifop, um instituto independente de pesquisas, 90% dos parisienses entrevistados declararam que “têm plena confiança na água da torneira e que a bebem durante as refeições”.
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Detalhe da fonte Wallace. Foto: Eau de Paris / Emile Luider
A Eau de Paris tem boa reputação por vários motivos. Primeiro, porque a gestão da água retornou ao setor público depois de 20 anos no setor privado, que aumentou os preços e não conseguiu bons resultados. Com a mudança, tanto consumidores como ONGs defensoras do meio ambiente passaram a ter o direito de participar nos conselhos de administração. Em segundo lugar, porque, ao contrário de outras empresas, a Eau de Paris parou de usar o sulfato de alumínio no tratamento há mais de 20 anos – justamente por causa do potencial risco à saúde dos habitantes, especialmente o relacionado à doença de Alzheimer. Metade da água da capital francesa vem de fontes subterrâneas, e as zonas de captação – que ficam a 150 quilômetros de distância – têm sido protegidas. Contratos são assinados com agricultores para eliminar o uso de agrotóxicos nessas áreas, estimulando cultivos orgânicos.
Existem, porém, alguns pontos negativos. Desde 2001, por causa do plano de vigilância Vigipirate (que define uma série de mecanismos para evitar atos de terrorismo, incluindo tentativas de contaminação da água), é preciso adicionar cloro à água no sistema de abastecimento. Isso faz com que a água de Paris tenha um gosto forte da substância, embora a concentração esteja dentro dos limites aceitáveis determinados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A empresa aconselha a botar a água na geladeira por 15 minutos para que o cloro evapore.
Ainda que exista um forte controle sobre a água de Paris e ela seja considerada de “excelente qualidade” pela autoridade sanitária da França, não são conhecidos os níveis de poluentes emergentes e perturbadores endócrinos contidos nela. “Esses parâmetros não são considerados pela legislação francesa. Mas a empresa fez as suas próprias análises. Esses poluentes estão presentes em níveis baixos na água da torneira e praticamente não foram detectados na casa dos consumidores. Mas é verdade que ainda falta informação para saber se esses níveis podem ter um impacto na saúde e, ainda, se existe o famoso ‘efeito coquetel’, ou seja, se todas essas moléculas juntas podem provocar algum dano”, reconhece Natalie Fleury, responsável pela qualidade na Eau de Paris.
Oficialmente, as autoridades sanitárias francesas e europeias estão mais preocupadas com a presença desses contaminantes na comida do que na água – particularmente os resíduos de antibióticos e de hormônios de crescimento na carne. Mas, ainda hoje, esse risco é um dos argumentos mais utilizados pelas empresas de água engarrafada para vender a água mineral.
O alto grau de confiança na água pelos parisienses foi conseguido depois de muito esforço da Eau de Paris. “Embora a empresa não conte com o orçamento que as empresas de água engarrafada têm, nos comunicamos muito sobre a qualidade para dar certeza e tranquilidade à população de que pode beber a água da torneira”, explica Elisabeth Thieblemont, responsável pela comunicação da empresa.
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Fonte prestes a ser inaugurada.Foto: Olivia Blaizac

A Eau de Paris tem toda uma estratégia de comunicação para a água e inclusive um setor de venda de objetos, como garrafas, para promover o consumo da água da torneira. Também faz, regularmente, campanhas de comunicação: a última fez referência ao vinho para promover a água da torneira com um gran cru, os seja, como um excelente vinho.
Na Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), embora o espaço físico onde fica a assessoria de comunicação da empresa seja enorme, não existe nenhuma ação para conscientizar a população sobre o consumo de água tratada. “Falamos sobre a economia que os clientes têm que fazer, mas nada sobre beber a água da torneira”, reconhece Wagner de Oliveira Prado, assessor de comunicação da Sabesp. Em São Paulo, isso seria necessário porque, entre os anos 70 e 80, o Ministério da Saúde aconselhava a ferver a água antes de beber. Essas recomendações ainda estão na cabeça das pessoas.
Contra o plástico
Sem nenhuma ajuda, duas ambientalistas criaram a iniciativa Água na Jarra, umas das primeiras que tentam limitar o uso do plástico. O projeto defende que os restaurantes assumam o compromisso de oferecer água da torneira para os consumidores, em vez de garrafas de água mineral. “É incrível ver que todos os restaurantes vendem garrafinhas de água somente para ganhar mais dinheiro, sem se preocupar com o meio ambiente”, explica Leyticia Janot, uma das criadoras do Água na Jarra. Todos os estabelecimentos que até hoje aderiram à iniciativa estão em São Paulo.
No Rio de Janeiro, a Lei Estadual 2424, de 1995, diz que “é obrigatório o fornecimento de água potável, filtrada e não mineral, gratuitamente, para uso dos consumidores no Estado do Rio de Janeiro” nos restaurantes. Isso é confirmado pelo Procon-RJ. Recentemente a entidade começou a sensibilizar esses estabelecimentos, porque reconhece que ninguém respeita a norma. O segundo passo será a fiscalização.
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Simulação 3D da fonte Poing do bonde T3. Ilustração: Eva Albarran & Co

Qualquer restaurante é obrigado a ter água filtrada, mesmo que os garçons digam que não podem oferecê-la. Esses estabelecimentos também precisam limpar regularmente a caixa d’água. Pouca gente se dá conta, mas não se usa água mineral engarrafada para fazer café. “Se os restaurantes passassem a usar garrafas grandes já seria uma vitória, embora a verdadeira vitória seria beber água da torneira”, diz Leyticia Janot. À medida que os consumidores se habituarem a pedir água filtrada, menor será a quantidade de plástico que acabará em rios, praias e aterros. E os donos de restaurantes poderão entender, aos poucos, os danos que as garrafas provocam ao meio ambiente.
O Brasil, como muitos outros países, ratificou que a água é um direito humano. Isso, porém, ainda não ocorre na prática.
Confira aqui o mapa das fontes de água na cidade de Paris.
* Publicado originalmente no site Agência Pública.

segunda-feira, 24 de março de 2014

A nova mobilidade urbana chega à Europa até 2020


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Europa 2020: inovação tecnológica em transporte. Foto: Divulgação
Neste artigo, o colaborador do Mobilize em Portugal Cláudio Mantero fala do Horizonte 2020, programa da UE para inovação na mobilidade urbana nos próximos seis anos.
Promover a inovação na mobilidade e na sustentabilidade do meio urbano, no período de 2014 até 2020, é a meta de um novo programa em desenvolvimento pela União Europeia (UE), denominado “smart, green and integrated transport”. O total do investimento previsto é 6,339 bilhões de euros.
É uma prática europeia consolidada a proposta de subsidiar o transporte. Mas, após várias experiências, ficou claro que o tema da mobilidade urbana necessita, além de medidas locais (mesmo acertadas como essa dos subsídios), de um claro e forte impulso central, que permita dotar as nações e as regiões do continente de mecanismos de financiamento estáveis e de políticas de orientação macro.
Um modelo de sucesso nessa linha é o projeto Civitas, definido após mais de 14 anos de investimentos locais de caráter inovador focados na mobilidade urbana. O modelo funda-se sobre 3 pilares:
1. testar soluções inovadores e replicar boas práticas;
2. investir em mecanismos de participação ativa da cidadania, sensibilização e informação para a mudança de hábitos (aqui definidas “soft mesures”);
3. envolver diretamente as cidades num debate amplo sobre a qualidade de vida e o futuro da mobilidade sustentável.
Horizonte 2020
Em dezembro do ano passado, foi lançado o novo quadro de financiamento para inovação, chamado Horizonte 2020, no âmbito da União Europeia. Foi a primeira grande candidatura da Comissão Europeia para projetos desta natureza.
O programa Horizonte 2020 deixa clara a aposta do continente europeu na mobilidade inovadora, capaz de gerar riqueza e melhor qualidade de vida.
Neste domínio, temáticas relevantes como a firme aposta na mobilidade elétrica são apresentadas como alternativa a longo prazo, na qual a tônica está: na possibilidade da integração e continuidade entre os modos; no suporte a sistemas urbanos de logística para otimização das cargas e desenvolvimento de soluções inteligentes low cost e de gestão descentralizadas; e também na aposta em sistemas de transporte público inovadores que, através de aplicações móveis e sistemas de “big data analysis”, permitam melhorar a relação entre procura e oferta, flexibilizando seus sistemas de operação para atrair sempre mais usuários.
Em todas as novas áreas de investimento e investigação, parecem haver temas específicos que voltam com mais frequência. É o caso da busca por uma inovação que possa ser incorporada em business models, social media com os big data. Também representa um interessante desafio de abordagem o tema da informação completa, com a consequente adaptação instantânea e contínua do sistema de mobilidade.
Este primeiro passo dado pelo Horizonte 2020 vai lançar, de forma forte e incisiva, temas que poderão realmente mudar a vida nas cidades europeias. É claro que todos os agentes de decisão deverão estar envolvidos permanentemente neste processo de inovação que deverá enriquecer a população atual e desenvolver novas (e ricas) economias da informação.
Resta a última e pertinente pergunta: Com tão grande investimento em inovação, a Europa poderá realmente assegurar (conforme mencionado no site da Comissão Europeia) a sua “liderança global no desenvolvimento da indústria europeia de transporte”?
Cláudio Mantero é sênior transport manager em Portugal. Contato: claudiomantero@gmail.com e bloghttp://nossomospeoes.blogspot.pt/
** Publicado originalmente no site Mobilize Brasil.

sábado, 22 de março de 2014

Decreto quer transformar vagas de carro na rua em espaço para as pessoas




parklet sfrancisco ecod Decreto quer transformar vagas de carro na rua em espaço para as pessoas
Parklet na Valencia Street, em São Francisco (EUA). Foto: Mark Hogan/Wikimedia Commons

São Paulo poderá tornar-se, em breve, a primeira cidade brasileira a regulamentar espaços exclusivamente para pessoas no lugar de carros. A intenção foi adiantada pelo prefeito Fernando Haddad na segunda-feira, 11 de março, durante uma reunião na qual o gestor prometeu a publicação de uma chamada pública de convocação às empresas interessadas em instalar deques sobre vagas para veículos em ruas da capital paulista.
A matemática é mais ou menos essa: no lugar de dois carros estacionados na rua, a prefeitura permitiria a construção de espaços permanentes para as pessoas conviverem, os chamados “parklets” (também conhecidos como “vagas vivas”).
O regramento da instalação dos parklets envolverá somente vias com velocidade máxima de 40km/h e onde não haja trânsito intenso de veículos motorizados. Em alguns locais será necessária a extinção da Zona Azul, que cobra uma taxa para o estacionamento de automóveis na rua de hora em hora. Um dos locais apontados por Haddad como candidatos à alteração urbanística é a Vila Madalena, na zona oeste da cidade.
Independentemente da localização, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano deverão se encarregar da avaliação individual das solicitações e de sua viabilidade física, levando em conta aspectos como o número de pessoas que circularão pelo local, por exemplo.
“Vagas vivas”
Prática regular de cidadãos e organizações voltadas à humanização das cidades, as vagas vivas são uma ocupação de vagas de estacionamento de carros transformadas em espaço para convivência, lazer e até áreas verdes, com plantas, bancos, entre outros elementos, como uma extensão da calçada.
A primeira Vaga Viva foi instalada por cidadãos em São Francisco, nos Estados Unidos, em 2006. A partir de então, tornou-se uma política urbanística local e é atualmente a cidade norte-americana que possui o maior número de estruturas. Posteriormente, houve instalações de parklets em cidades como Boston, também nos Estados Unidos, Puebla de Zaragoza, no México, e Vancouver, no Canadá.
* Publicado originalmente no site EcoD.

sexta-feira, 21 de março de 2014

Sobre crianças e mentes colonizadas





criancas Sobre crianças e mentes colonizadas


Ao formar consumidores precoces, publicidade infantil inibe outras maneiras de socialização e sugere: relações humanas precisam ser validadas por mercadorias…
No dia 15 de março comemorou-se o Dia Internacional dos Direitos do Consumidor. Nessa mesma data, em 1962, o então presidente dos EUA, John F. Kennedy, enviou uma mensagem ao congresso norte-americano chamando atenção da sociedade para garantias básicas, até então pouco conhecidas e negligenciadas como o direito de proteção contra propagandas e embalagens fraudulentas, o direito de escolha e informação frente aos produtos e o direito de ser ouvido.
Ao formar consumidores precoces, publicidade infantil inibe outras maneiras de socialização e sugere: relações humanas precisam ser validadas por mercadorias…
No dia 15 de março comemorou-se o Dia Internacional dos Direitos do Consumidor. Nessa mesma data, em 1962, o então presidente dos EUA, John F. Kennedy, enviou uma mensagem ao congresso norte-americano chamando atenção da sociedade para garantias básicas, até então pouco conhecidas e negligenciadas como o direito de proteção contra propagandas e embalagens fraudulentas, o direito de escolha e informação frente aos produtos e o direito de ser ouvido.
A mensagem deixava evidente a urgência da questão. Porém, a primeira comemoração da data se deu em 1983, e foi somente dois anos depois que a ONU reconheceu os direitos dos consumidores, legitimando internacionalmente a causa. Já no Brasil, o Código de Defesa do Consumidor, um dos mais completos e ousados do mundo, entrou em vigência em 1990, dois anos após a promulgação da atual Constituição Federal, e pode ser visto como resposta do poder público aos anseios da sociedade civil em relação aos avanços desgovernados da sociedade de consumo.
Curiosamente, é também dos anos 90 que muitos autores datam a crise conceitual da infância, pois foi quando as crianças, historicamente vistas e tratadas como um vir a ser que precisavam ser preparadas para o mundo adulto, foram elevadas pelo mercado ao status de consumidoras – antes mesmo de poderem exercer plenamente sua cidadania. Tidas até então como filhas de cliente, as crianças passaram a ser consideradas como consumidoras finais, tornando-se um alvo importante do mercado de consumo de produtos e serviços – um potencial nicho comercial.
Foi nesse contexto que a publicidade dirigida às crianças entrou em cena com grande força. Passou a endereçar ao público infantil mensagens de apelo ao consumo, que se aproveitam da vulnerabilidade infantil para vender. Tornou-se, segundo pesquisa da Intersciense, de 2003, a principal influência de compras dos produtos infantis com embalagens e personagens famosos. Hoje, contudo, a publicidade não endereça às crianças somente mensagens de produtos infantis, mas também de objetos adultos. Isso deve-se ao fato deste público estar sendo encarado pelo mercado como porta de entrada para a influência nos hábitos de consumo de toda a família.
Dados mundiais a esse respeito apontam que a influência das crianças nas compras realizadas pela família chega a 80% em relação a tudo o que é consumido, inclusive em relação a bens e serviços de interesse exclusivo dos adultos, como, por exemplo, marcas de automóvel, imóveis, produtos de limpeza etc. No Brasil, só a moda infanto-juvenil movimenta a soma anual de R$10 bilhões, o que corresponde a um terço de toda a roupa consumida no país.
A partir desses dados podemos dizer que o mercado enxergou nas crianças uma rentável fonte de lucros, já que quanto mais cedo você fideliza a criança a uma marca, mais chances tem dela ser fiel à mesma do berço ao túmulo, como dizem os publicitários. Assim, aproveitando-se da fragilidade e vulnerabilidade infantil, o mercado passou, então, não somente a atrair os olhares das crianças, como a dirigir-se diretamente a elas com peças publicitárias feitas “sob medida”.
Não foi à toa, portanto, que o Código de Defesa do Consumidor Brasileiro previu proteger as crianças de apelos de consumo, instituindo no Art. 37: “É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva (…)”, e explicando no seu parágrafo§2º que “É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeite valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. (…)”.
As crianças são convidadas pela publicidade – que lhes é ilegalmente dirigida – a ingressar cada vez mais cedo no complexo mundo adulto do consumo. A lógica do consumo domina as relações infantis e acaba restringindo a criatividade e as trocas afetivas das crianças, além de queimar etapas importantíssimas do seu desenvolvimento.
A criança será, em função do tempo em que vivemos, uma consumidora no futuro. Logo, além de protegê-la legalmente da comunicação mercadológica, como já fizeram 28 países do mundo, incluindo os dez com melhor qualidade de vida –,precisamos prepará-la para que seja uma cidadã e consumidora consciente e responsável. Isso é feito com Educação, principal ferramenta no processo de transformação social. Lembre-se: educar, assim como consumir, é um ato político.
Precisamos começar a educar nossas crianças para que tenham responsabilidade ao comprar. O direito à educação para um consumo consciente é não só um desafio, como também a solução para os problemas morais e ambientais de nossos tempos.
O principal direito das crianças é o direito à infância. Pensemos no direito de escolha e de proteção de nossas crianças frente ao bombardeio publicitário que as convida a tornar-se adultas antes do tempo. Elas são o prefácio para um mundo mais ético e sustentável, e têm nas mãos o poder de reinventar as relações de consumo. Tudo depende de vontade política e atuação conjunta em duas frentes: regulação e educação.
Lais Fontenelle Pereira, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio e autora de livros infantis, é especialista no tema Criança, Consumo e Mídia. Ativista pelos direitos da criança frente às relações de consumo, é consultora do Instituto Alana, onde coordenou durante 6 anos as áreas de Educação e Pesquisa do Projeto Criança e Consumo.
** Publicado originalmente no site Outras Palavras.

domingo, 16 de março de 2014

Ainda se morre de fome no Brasil


A chegada de uma mineradora a uma região próxima a um quilombo nos arredores da cidade de Goiânia mudou a rotina dos moradores. Eles sonharam com empregos, mas poucos se concretizaram. A disputa pela terra se acirrou, o espaço para plantar diminuiu. O jeito passou a ser comprar comida. Os modos de vida se alteraram, as relações foram atropeladas. E, como resultado, as comunidades vivem hoje uma nova tragédia: em troca de alimento, há famílias que oferecem até suas filhas a operários da mineração. A prostituição infantil passou a ser uma triste realidade no quilombo.
A denúncia foi feita recentemente no Fórum Brasileiro de Segurança e Soberania Alimentar (FBSSAN), em junho, pelo Grupo de Mulheres Negras Malunga. Desde então, de acordo com a organização, nada mudou e a situação só se agrava. O caso se perde em meio a outros que se multiplicam Brasil afora, invisíveis frente à euforia das estatísticas que mostram a redução da fome em nível nacional.
Segundo a ONU para Alimentação e Agricultura (FAO), o número de 22,8 milhões de pessoas em 1992 com fome caiu para 13,6 milhões em 2012. A mudança foi significativa, pois, em 1990, 15% dos brasileiros passavam fome. Hoje, são 6,9%. Procurado pelo Canal Ibase, o MDS disse não ter os dados das áreas específicas onde há insegurança alimentar, sugerindo que se procurasse o IBGE.
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Indígenas são o maior grupo de risco do país. Foto: Reprodução/ Internet
Os dados recentes poderiam ser festejados, já que a economia brasileira é a sétima do mundo em termos de Produto Interno Bruto e, em alguma medida, isso se reverteu em mudança social. Mas, ao seguir à risca um modelo de desenvolvimento excludente, surge um anticlímax: o país se expõe a um vexame quando se verifica a persistência da fome em algumas regiões. O que vem à tona claramente sobre o tema é que o Norte e o Nordeste apresentam quadros de insegurança alimentar incompatíveis com a riqueza nacional. Nessa geografia da fome atual, existem territórios em que populações vivem situações gravíssimas, como afirma Francisco Menezes, pesquisador do Ibase e referência nacional no tema:
- Eu diria que os que estão em pior situação atualmente são os indígenas. Em muitas regiões, perderam suas terras (com a chegada da soja, cana, etc), foram muito violentados em sua cultura e vivem situações de calamidade, ao qual o Estado pouco ou nada contribui – diz Menezes, fazendo um contraponto à euforia das estatísticas.
Na Terra Indígena Governador, no município de Amarantes, a 700 km da capital maranhense, o problema da fome está associado ao conflito com latifundiários do agronegócio e, consequentemente, à dificuldade de acesso à terra. Como o Brasil nunca consolidou uma reforma agrária de fato, há muitas comunidades abandonadas pela ausência de garantia do território pelo Estado. Segundo Joaquim Cardoso, morador da TI de Governador e membro do comitê gestor da Fundação Nacional do Índio (Funai), há muitos indígenas sofrendo por escassez de alimentos:
- A falta de acesso à terra no país é uma das causadoras da fome. Sem regularização de terras, o governo deixa que as batalhas continuem. Os pequenos, claro, continuam perdendo. Há índios na beira da estrada, sem ter onde plantar e sem dinheiro para comprar – contou Joaquim em entrevista ao Canal Ibase.
Nordeste é maior foco da fome no país
A situação dos índios só ganhou visibilidade com o anúncio de um possível suicídio coletivo dos Guarani-Kaiowa, um ano atrás. Mas a situação permanece inalterada lá e em muitos outros territórios indígenas espalhados pelo país.
A professora Sandra Maria Chaves dos Santos, da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia, afirma que os dados dos últimos 20 anos deixam clara a diminuição da fome do país, mas isso não é justificativa, enfatiza ela, para deixar de combatê-la. Ela estuda o tema na região Nordeste e afirma que, em Sergipe, por exemplo, houve melhora. Mas a insegurança alimentar continua grave em outros estados.
- E como serão os resultados do próximo censo do IBGE em relação à fome, levando-se em conta que a seca da região já dura quase três anos? – ressalta ela.
No Vale do Jiquiriçá, a professora fez uma pesquisa com base na Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) e de um questionário socioeconômico. O resultado é que, de 2.002 domicílios, constatou-se insegurança alimentar em 70,3%, com predomínio da insegurança grave e moderada (36,0%) em nove municípios.
- Há que se chamar atenção quanto às estatísticas do Censo de 2010. Embora tenha havido uma redução importante da fome, o que se vê nos dados é a manutenção das desigualdades regionais. O problema é estrutural. Quanto menor o nível de escolaridade, por exemplo, maior é o risco de insegurança alimentar – diz ela.
No contexto atual, em que muitas populações estão na iminência de perder acesso à terra com a chegada de megaempreendimentos e a expansão do agronegócio, a situação se agrava. É o que afirma o coordenador-executivo da Action Aid Brasil, Adriano Campolina:
- As obras de infraestrutura no Brasil estão gerando novas pobrezas, com a expulsão das pessoas de seus locais de origem. Precisamos reverter isso, que também ocorre em função dos megaeventos esportivos: a Copa e as Olimpíadas.
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Foto: http://www.shutterstock.com/
A presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emília Pacheco, diz que o desafio é frear esse processo.
- É preciso investir na agricultura familiar, no banimento do uso de agrotóxicos. Há um conjunto articulador de políticas que está diretamente relacionado à segurança alimentar. O alimento tem que ser visto como direito humano e não como mercadoria.
Para Maria Emília, a soberania alimentar ainda não foi alcançada no país. Isso, prevê a presidente do Consea, só ocorrerá quando todos os povos tiverem direito de estabelecer suas políticas do direito humano à alimentação.
- É preciso pensar a produção, a distribuição e o acesso ao alimento. E não adianta apenas comer, é preciso saber quais alimentos estão chegando à mesa dos brasileiros. O Brasil assiste neste momento, por exemplo, ao aumento do sobrepeso. E há casos que combinam subnutrição com sobrepeso devido à baixa qualidade dos alimentos.
Há pesquisadores que questionam, inclusive, se alguns alimentos superprocessados devem ser chamados de alimentos. Nessa linha, a professora Inês Rugani, do Departamento de Nutrição da Uerj, aponta um aspecto dramático no país, que aparece também no programa Bolsa Família. Ela alerta que famílias cuja renda é mais baixa estão adquirindo o hábito de comprar alimentos processados, a fim de consumir produtos semelhantes aos da classe média.
A professora Inês Rugani, do Departamento de Nutrição da Uerj, vê um um aspecto dramático no país, que aparece também no programa Bolsa Família. Ela alerta que famílias cuja renda é mais baixa estão adquirindo o hábito de comprar alimentos processados, a fim de consumir produtos semelhantes aos da classe média.
- A qualidade da alimentação cai muito, e a consequência na saúde é direta, como o aumento da diabetes. Um grande exemplo são os refrigerantes. Os mais baratos são ainda mais nocivos do que os mais divulgados pela propaganda maciça.
As pessoas a que Rugani se refere ao menos são beneficiadas por políticas públicas, como o Bolsa-Família. Mas há aquelas que ainda sofrem de privação.
- Ainda se morre de fome no Brasil – afirma Francisco Menezes.* Publicado originalmente no site Canal Ibase.